Com 1.138 novos carros elétricos, vendas no RS crescem 25,19% nos primeiros sete meses do ano
Considerado o futuro da indústria automotiva mundial, o mercado de veículos elétricos emplacou no Rio Grande do Sul 1.138 novos carros nos primeiros sete meses do ano e superou em 25,19% as 909 unidades de igual período do ano passado, segundo dados da Associação Brasileira de Veículos Elétricos (ABVE).
O desempenho gaúcho ficou abaixo da média do país, de 34,46%, com 23.563 automóveis eletrificados de janeiro a julho, mas é maior, por exemplo, do que as vendas realizadas por aqui em todo o ano de 2020, de 1.043.
No ano passado, a taxa de crescimento do Estado, nesse segmento, havia sido de 81,9% — acima da nacional, que foi 77%. Para o diretor de veículos leves da ABVE, vice-presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e diretor da montadora Audi, Antônio Calcagnotto, os números apontam que a diminuição da velocidade de ampliação do setor está diretamente ligada à estrutura de recarga e aos incentivos.
Ele lembra que o RS é um dos oito Estados do Brasil que já isentam o IPVA dos carros elétricos — assim como Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Piauí, Maranhão e Ceará. Por outro lado, afirma, está atrasado em infraestrutura de recargas na comparação com Paraná e Santa Catarina, dois dos mais avançados nesse quesito. E cobra incentivos, como a redução do IPI na fabricação dos carros elétricos.
Calcagnotto explica que a autonomia dos veículos (de 200 a quase 500 quilômetros) já não encontra dificuldades para ser abastecida diariamente nas grandes cidades, onde shoppings, hotéis, centros comerciais e residências dão conta da demanda incipiente. Os problemas de mobilidade, diz, começam nas estradas.
O executivo, que é gaúcho, conta que entre São Paulo e Porto Alegre, o deslocamento é seguro até Laguna, em Santa Catarina. Depois, a disponibilidade de opções, especificamente no Rio Grande do Sul, deixa a desejar.
— Existe uma interdependência entre o crescimento do mercado e a disponibilidade de infraestrutura de recarga. No país, algumas iniciativas tendem a acelerar o processo, mas ainda faltam incentivos — analisa Calcagnotto.
Um estudo elaborado pela Anfavea indica que até 2035, quando deverão circular mais de 3 milhões de automóveis eletrificados no Brasil, seriam necessárias 155 mil estações de recarga rápida — que utilizam corrente alternada e levam menos de 30 minutos. Hoje, com uma frota de 100 mil veículos e vendas anuais que não atingem 2% da movimentação dos 2,5 milhões de automóveis, em média, não passam de cem pontos como esses em operação. No total, somando-se às demais modalidades — as semirrápidas (de quatro a oito horas) e as lentas (de oito a 12 horas) — são 8 mil.
Nesse aspecto, recentes anúncios da Shell e também da Vibra Energia (nova controladora da BR Distribuidora) contemplam o início da instalação de opções junto aos postos de combustíveis de ambas as bandeiras. Para Calcagnotto, este é o caminho correto a ser trilhado, além dos projetos de pesquisa e desenvolvimento, financiados pelas concessionárias de energia.
Oportunidades
Israel Teixeira, diretor dos Laboratórios Especializados em Eletroeletrônica, Calibração e Ensaios (Labelo) da PUCRS, também percebe que o crescimento da frota pode estar “obstaculizado” pela falta de infraestrutura. Mas vê, com isso, muita margem para crescimento e oportunidades de negócios, sobretudo, com investimentos privados.
— Shoppings, restaurantes, estacionamentos de hotéis podem ter na oferta de recarga um diferencial para a atração de consumidores nesse momento inicial. Isso também possibilita novos modelos de negócios para startups na criação de softwares e uma gama de serviços — analisa.
Ele recorda que o Brasil atingiu recentemente a marca de 100 mil carros eletrificados emplacados. Nas grandes cidades, lembra, o uso de motos e bicicletas elétricas é cada vez mais comum, ônibus movidos a diesel estão sendo substituídos por aqueles com motor elétrico, pontos de recarga de veículo se multiplicam por estacionamentos ou pelas ruas e, para qualquer lado que se olhe, a eletrificação do transporte é uma realidade presente.
No entanto, a legislação atual ainda deixa brechas. Na portaria 819 de 2018, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), por exemplo, a energia elétrica das estações de recarga é classificada como um serviço, portanto sujeita a incidência do ISS, tributo municipal de alíquota mais baixa do que o ICMS estadual.
Por isso, a alternativa de remuneração de capital para o surgimento de iniciativas que cobrem pela recarga (a maior parte das existentes hoje é oferecida gratuitamente pelos estabelecimentos) é um dos aspectos citados pelo professor. Ele também participa ativamente da criação de um laboratório de testagem de componentes, como os carregadores, oferecidos no Brasil dentro de padrões internacionais de qualidade e chama a atenção para a necessidade de avanços também nessa área.
Nasce uma Rota Elétrica no RS
Uma parceria entre a CEEE Grupo Equatorial e a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) gerou o projeto de pesquisa e desenvolvimento que permitirá, já em 2023, que os usuários de veículos elétricos que circulam pelo Estado possam se deslocar, com segurança de abastecimento, por praticamente todo o território gaúcho. Batizado de Rota Elétrica Mercosul — Suporte ao Desenvolvimento e Gerenciamento para Mobilidade Inteligente, o percurso é resultado de um projeto aprovado junto à Aneel e conta com recursos de R$ 18 milhões da CEEE Grupo Equatorial para ser executado pela UFSM.
A Rota Elétrica Mercosul terá 916 quilômetros e será composta de estações de recarga rápida — média de 30 minutos —, em cidades como Torres, Porto Alegre, Camaquã, Pelotas, Jaguarão, Rio Grande e Chuí. O objetivo é que seja possível viajar de carro elétrico até o Uruguai, que já possui uma rota bastante robusta de estações de recarga em seu território, assim como Paraná (onde está a maior eletrovia do país) e Santa Catarina.
A partir do país vizinho, também será possível chegar a Buenos Aires, na Argentina, pela travessia do estuário do Prata. Há possibilidade de interligação com o Paraguai seguindo pelas estações de recarga que já existem das Centrais Elétricas de Santa Catarina (Celesc) e da Companhia Paranaense de Energia (Copel).
A coordenadora do projeto pela UFSM, professora Alzenira Abaide, afirma que a integração é um trajeto que se conecta. Segundo ela, além do benefício ambiental na utilização de veículos elétricos, os três Estados do sul do Brasil recebem muitos turistas que vêm do Uruguai, Argentina e Paraguai em direção ao litoral.
— Vamos colocar à disposição uma rota elétrica, barateando a viagem e fazendo o turismo daqui ser ainda mais atrativo — comenta a professora.
A pretensão é instalar uma microrrede junto à estação eólica de Osório, com aerogerador e painéis fotovoltaicos. Assim, durante o dia, com sol ou vento, o processo de geração de energia se tornaria ainda mais limpo. Outra frente do projeto também analisará o impacto dos abastecimentos para rede.
Por aqui, explica a analista de operações de Pesquisa e Desenvolvimento da CEEE Grupo Equatorial, Ilana Franca dos Santos, as estações começarão a ser instaladas a partir de dezembro em locais nos quais já existem conveniências para que o motorista esteja em um local seguro para fazer a sua recarga. Segundo ela, a ideia é que um aplicativo informe em tempo real se a estação está disponível ou se está ocupada, além da funcionalidade de reserva de horário para evitar filas.
Após a entrada em operação da rota, terá início a análise do comportamento das estações. Durante a execução do projeto, que se encerra em setembro de 2024, não haverá nenhuma cobrança pelas recargas.
— A legislação relacionada à cobrança de energia, atualmente, ainda não contempla esse tipo de situação. Hoje, apenas as concessionárias podem cobrar pela venda de energia — diz Alzenira.
ZH