No encerramento de mais uma temporada de balanços, as 16 maiores companhias do Rio Grande do Sul na bolsa de valores lucraram R$ 2,17 bilhões, entre abril e junho. A cifra é 39,8% inferior aos R$ 3,61 bilhões contabilizados em igual período do ano passado. Das gaúchas listadas na B3, sete tiveram melhoria no lucro líquido, na comparação entre o segundo trimestre de 2023 e 2024.
Outras nove apresentaram redução do indicador no mesmo intervalo. Apenas Taurus, Quero-Quero e CEEE fecharam com prejuízo líquido – nos dois últimos casos, o desempenho ficou acima do verificado nos três meses iniciais do ano passado. Caso fosse retirada a Gerdau do levantamento (por seu tamanho, pode distorcer o resultado tanto para cima como para baixo), a redução ficaria em 11,5% – de R$ 1,48 bilhão para R$ 1,31 bilhão.
Ao contrário do que possa parecer, os dados mostram pouca influência da enchente. Isso acontece, porque o fator local tem menor relevância nas performances, uma vez que essas corporações atuam em mercado nacional ou global e, portanto, sofrem mais com a incidência de outros fatores. É o caso do câmbio e dos juros, por exemplo.
Ainda assim, a catástrofe ambiental alterou o rali das ações de algumas das companhias e plantou a desconfiança nas análises de mercado. A dúvida, que trouxe reflexos na cotação dos ativos em bolsa nos últimos 90 dias, pairava “em quanto” os efeitos de eventual deterioração das contas de maio e junho poderia afetar negativamente os balanços trimestrais obrigatórios dessas empresas. A Lojas Renner foi o exemplo mais emblemático deste cenário de volatilidade.
Antes da divulgação dos resultados, em 8 de agosto, essa era a pergunta em aberto. Em entrevista à Zero Hora, o CEO da empresa, Fábio Faccio, explicou, na ocasião: por mais que cerca de 10% das vendas da varejista gaúcha estejam concentradas no Estado, a dinâmica da enchente teve efeito negativo num primeiro momento, mas, logo em seguida, reverteu a curva e resultou em vendas acima da expectativa.
O lucro líquido de R$ 314,9 milhões só não foi não maior, em razão de ajustes realizados pela empresa. Exemplo citado por Faccio foi a fase final de integração de um novo centro logístico, que centralizará as distribuições das crescentes vendas online, segmento estratégico para os negócios no futuro.
Efeito nas ações
Em razão da enchente, as ações LREN3 saíram de R$ 16,40, em 2 de maio, para R$ 12,16, em 2 de julho, queda de 25,85%. Antes, a trajetória era de alta. Bateu em R$ 17,40 ao longo de abril e o papel não era negociado abaixo do patamar de R$ 14 desde novembro do ano passado.
A gangorra vivenciada pela LREN3, lembra Valter Bianchi Filho, sócio-fundador da gestora de patrimônio Fundamenta, não é caso isolado para as gaúchas no período:
— Diria que as empresas gaúchas, no geral, demonstraram grande resiliência diante de tudo que aconteceu. A questão da enchente, quando ocorreu, o mercado acabou batendo muito forte em vários papéis, e os resultados de segundo trimestre mostraram que houve grande exagero, e muitos daqueles que se apressaram em vender papéis por causa da enchente, acabaram errando — avalia.
Na última sexta-feira (23), a ação da Lojas Renner fechou cotada a R$ 17,54.
Especulações X Resultados
- Grendene
Fundada no RS, a empresa ainda mantém cerca de 2 mil colaboradores no Estado, a maioria em Farroupilha. Menos de 20 funcionários sofreram impacto direto das águas e cerca de 7% das vendas estão concentradas por aqui, segundo assinala o diretor financeiro Alceu Albuquerque. Por outro lado, 20% da receita vem do mercado externo, o que também gera custo em dólares. Nesse aspecto, o fechamento do mercado argentino e a concorrência dos sites estrangeiros como Ali Express e Shen, agora, taxados no Brasil, têm mais influência para a fabricante da Melissa, da Ipanema e do Raider, entre outras, do que o clima. - Panvel
Bastante dependente do mercado gaúcho, a Panvel é dos poucos casos em que o balanço, com lucro líquido em queda de 77% na comparação com igual trimestre do ano anterior, pode ser atribuído aos efeitos da enchente. No dia 3 de maio, uma sexta-feira, os funcionários não conseguiram acessar à sede da companhia em Eldorado do Sul, cidade que seria 100% alagada até o domingo (5). O local servia de centro de distribuição para as 606 farmácias do grupo. Com dificuldade de abastecimento, a companhia amargou impactos diretos no balanço trimestral. As ações PNVL3 caíram 15,7%, de R$ 11,51, em 3 de maio, para R$ 9,70, em 2 de julho. Na sexta-feira (23), já eram negociados a R$ 10,63.
- Randon
Exposta à dinâmica do agronegócio, a Randon enfrentou dois momentos. A RAPT4, guiada pela venda de reboques usados em caminhões que transportam a safra, atualmente prejudicada, amargou queda de 19,37%, entre o dia 3 de maio, cotada a R$ 11,20, e 17 de junho, quando era negociada na bolsa a R$ 9,03. No entanto, em 20 de junho, antes do balanço, a publicação do tradicional relatório ITAU BBA projetando crescimento de 76,1% para a fabricante da Serra, este ano, fez os ventos mudarem. Assim, em 2 de julho, os papéis bateram em R$ 11,17, ou seja, praticamente devolveram à baixa associada à enchente, ainda que no balanço, publicado em agosto, o lucro líquido tenha diminuído em 26%. - Marcopolo
Sem o impulso dado pelas projeções do ITAU BBA, a outra gigante de Caxias, Marcopolo ficou desguarnecida diante da especulações negativas associadas à enchente. Entre 3 de maio e 2 de julho, caiu 11,37%, de R$ 7,03 para R$ 6,23. Nesse caso, a mola propulsora para a fabricante de ônibus foi o próprio balanço e lucro líquido de R$ 244,9 milhões, alta de 76% na comparação com o segundo trimestre de 2023. Somente no dia da divulgação, em 2 de agosto, a POMO4 avançou 10,7%, de R$ 6,12 para R$ 6,78. Desde então, acumula alta de 13,23%, negociada a R$ 6,93 na sexta-feira (23).
- BANRISUL
Frente às primeiras notícias sobre alagamentos em centenas de cidades do Estado, conforme lembra Valter Bianchi Filho, sócio fundador da gestora de patrimônio Fundamenta, as ações do Banrisul (BSRN6) começaram a derreter na B3. Em 30 dias, desde a cotação de R$ 12,61, em 3 de maio, houve queda de 15,22% até o dia 2 de junho, quando eram negociadas a R$ 10,89. Bianchi explica que o movimento foi associado a uma precificação equivocada sobre o aumento do custo de crédito e eventual explosão da inadimplência o que não se confirmou. Pelo contrário, houve melhora em ambos os fundamentos e, nesse primeiro momento, diz Bianchi, as linhas de suporte operadas pela estatal reagiram bem. O balanço fechou com o lucro líquido em alta de 7%. As ações em 23 de agosto já eram negociadas a R$ 12,64.
ZH
Foto: Ricardo Teles / Gerdau/Divulgação